Mais do que nunca habilidades como empatia, colaboração e escuta ativa orientarão as empresas em torno de uma experiência de trabalho mais humanizada.
Não é de hoje que automatizamos comportamentos socialmente nocivos. A pandemia não é a causa do vazio nas relações. Antes disso, é um agente potencializador das fragilidades humanas. A desconexão é representada pela fragmentação do mundo.
Nações seguem lutando e enfrentando problemas globais isoladamente, tomando decisões éticas, políticas, civis, econômicas, científicas ou tecnológicas normalmente focadas em benefício próprio e na preservação da territorialidade, deixando de enxergar o impacto de suas ações em escala mundial.
Yuval Harari, autor dos livros “Sapiens” e “Homodeus”, é categórico ao dizer que é necessária união para resolvermos os problemas complexos de um mundo também complexo. Como exemplo, ele aponta como a complexidade está presente em questões éticas referentes à biotecnologia. Para o escritor, temas como as intervenções e os estudos genéticos ou a manipulação de DNA não podem ser debatidos apenas por uma nação, ou seja, de forma isolada. Este tipo de discussão diz respeito a todos no mundo, e os fóruns precisam ser coletivos.
Durante a edição de 2021 da SXSW, o painel “Future of emotion AI and empathy economy” teve participação de Rana El Kaliouby, CEO da Affectiva, que liderou um grupo de computação humanizada no Media Lab do MIT. Para a pesquisadora, vivemos uma crise de empatia e o que nos levou a isso foi a forma como a tecnologia tem sido desenhada e como as empresas vêm se desenvolvendo distantes de relações e objetivos justos, que beiram a irresponsabilidade.
Segundo Rana, precisamos ressignificar a modelagem tecnológica e pensar em como aproximá-la do fator humano cada vez mais. Isso não é uma crítica às automações e à Inteligência Artificial. Na verdade, é um alerta para que o futuro seja pensado de forma a viabilizar uma relação com a tecnologia mais humanizada e menos robotizada.
A cientista chamou ainda a atenção para a necessidade de as empresas de tecnologia se preocuparem com questões éticas, com os vieses, e respeitarem a privacidade das pessoas. É necessário união e protagonismo dos empresários e investidores junto com os órgãos governamentais no que diz respeito às regulamentações, ao invés de uma espera passiva para que as leis sejam homologadas.
Outro painel do evento, nomeado “Reimagine Care: The intersection of Tech and Touch”, debateu a aplicação de tecnologia na área da saúde. A opinião dos participantes foi consensual: o acesso à internet se transformou em um direito civil, assim como a água e outros ativos básicos para a nossa sobrevivência. Explicaram como o problema não é a tecnologia desenvolvida em si e sim a disseminação e o acesso para todos, assim como a educação e o aculturamento da sociedade diante do tema.
Também destacaram a importância da experiência para os pacientes em relação aos serviços digitais criados para resolver problemas da saúde, citando o exemplo de conexão mais eficiente entre médico e paciente na pandemia, especialmente após a disseminação em maior escala da telemedicina, que trouxe resultados muito satisfatórios no mundo. É um modelo validado na perspectiva de que é possível acompanhar e orientar o paciente fora do hospital em determinados casos.
Outra perspectiva importante é a disseminação uso dos wearables pelos pacientes, combinado ao cruzamento de dados com o histórico de saúde, o que tem mudado a lógica de experiência e relação com médico, promovendo momentos mais empáticos e relacionais: sobra mais tempo para análise, troca e observação do paciente por parte do médico.
Por fim, no mundo do trabalho, o painel “Pivot to Growth: The business of experience” retratou a importância de as empresas se tornarem obcecadas por seus clientes para transpor as relações de consumo atuais a um patamar que tenha foco na experiência em todos os pontos da jornada de relacionamento. E que essa postura só será possível quando seus colaboradores e a cultura também fizerem parte da agenda prioritária dos negócios.
Mais do que nunca habilidades como empatia, colaboração e escuta ativa orientarão as empresas em torno de uma experiência de trabalho mais humanizada, mesmo em tempos de hiperconexão. É nesse contexto que as lideranças podem se reinventar: comportamentos como demonstrar vulnerabilidade, encorajar as pessoas e estimular o senso de pertencimento — como criar safe places para os colaboradores — passam a ser fundamentais.
Reprodução do artigo veiculado no Meio&Mensagem. Acesse aqui o conteúdo original.
Excelente artigo! Parabéns! A força do interesse pessoal e econômico colocado de todas as formas em primeiro plano é algo assustador e, infelizmente, se intensificou muito durante essa pandemia. Que tenhamos mais vozes clamando pelo senso coletivo, do trabalho conjunto em busca de um bem maior e não somente voltado ao interesse individual.